Num dos artigos anteriormente escritos pelo diretor técnico do FIT IT, Luiz Santos, ficámos a conhecer um pouco dos benefícios que a prática regular de exercício físico pode ter na nossa Saúde mental.
Como estudante de Psicoterapia Somática e curiosa da mente humana, venho falar um pouco da importância que o nosso ser emocional também tem na nossa saúde mental. Na base da Psicoterapia Somática está o tratar do corpo e da mente de forma conjunta. Os sintomas de um interferem no outro, assim como o tratamento de um implica o outro. E como refere o médico neurologista e neurocientista António Damásio, que trabalha no estudo do cérebro e das emoções, a mente e corpo são dimensões de um só e mesmo organismo.
Desde cedo fomos ensinados a ter cuidado com a nossa higiene física pessoal, o nosso aspeto. Devemos escovar os dentes, cortar as unhas, tomar banho, andarmos cheirosos, limpos e apresentáveis para o mundo. Se caíssemos sabíamos como tratar dessa ferida, por exemplo, ou saberíamos a quem recorrer para a tratar. Íamos assim mantendo os devidos cuidados até que a mesma estivesse sarada. Aprendemos também sobre a importância de uma alimentação equilibrada, através da roda dos alimentos. Ou da importância de comer vegetais, em que os nossos cuidadores se recorriam muitas vezes das mais diversas invenções e performances teatrais para nos “impingir” o belo do legume.
Na escola aprendemos a importância de nos mexermos, através das aulas de educação física. Havia também uma grande preocupação dos nossos cuidadores em nos colocar numa atividade extracurricular que nos permitissem mexer mais e interagir mais com outras pessoas. Esta foi a paisagem sociocultural em que crescemos, e estes foram os ensinamentos que foram passando de geração em geração ao longo dos anos.
As questões acima referidas continuam a ser super importantes e válidas para o nosso desenvolvimento como seres humanos. No entanto, onde se situa a nossa saúde emocional? Será que sabemos o que é? Será que sabemos o que fazer para manter uma boa saúde emocional? E em caso de “lesão” emocional, sabemos o que fazer para cuidar da nossa ferida? Será que sequer sabemos que podemos ter uma “lesão” emocional?
Como já muitos de nós experienciamos, a dor emocional às vezes parece pior que a dor física. E se ignorada pode muitas vezes piorar e impactar negativamente as nossas vidas. Todos nós já sofremos o impacto da rejeição, do fracasso, do julgamento. Mas e o que aprendemos a fazer com esse impacto?
“Ah és uma menina tao bonita, estás a chorar para quê? Já passou”
“Ah os meninos não choram”.
Aprendemos assim a reprimir as nossas emoções, a reprimir esta parte emocional do nosso ser, uma parte de nós que tem tanto para nos ajudar como para nos adoecer.
“Ah vai dar uma volta, vai espairecer que isso já passa”. Varremos para debaixo do tapete o que não queremos encarar.
Corremos na rodinha do rato sem saber ou sem saber como sair.
Mas então o que é a Higiene emocional?
“Perceber e cuidar da saúde psicológica, adotando pequenos hábitos para monitorizar e tratar as feridas psicológicas quando as sustentamos. Assim como praticamos uma boa higiene física, lavar os dentes ou tomar banho todos os dias, a higiene emocional também se beneficia de pequenas práticas diárias que nos dão um senso de equilíbrio. Isto inclui prestar atenção aos nossos sentimentos, manter hábitos saudáveis e lidar com a dor emocional.” (1)
Nunca tinhas ouvido falar nisto? Não te preocupes, eu também não até há uns anos atrás. Quando me vi numa altura da vida em que “ou vai ou racha”, após anos acumulados de distúrbio do foro alimentar, depressão e coração partido. A depressão levou-me a olhar para dentro, à descoberta, à transformação.
Apenas fomos crescendo com o que nos ensinaram sem pensarmos muito nisso. Mas tal como referido no artigo “Benefícios do exercício físico para a saúde mental”, vivemos numa era com muitos estímulos externos, daí talvez a saúde mental ter começado a ganhar um maior movimento pois a necessidade de novas ferramentas para a nossa sobrevivência também mudou, sobretudo se comparada com a dos nossos antepassados.
A premissa é simples, no entanto super complexa: Se cuidamos da nossa higiene física então porque não cuidar da nossa higiene emocional?
Disse-me uma amiga há uns anos atrás: “Dani, se gostas de ti e queres o melhor para ti então não podes andar em bicos dos pés para sempre”.
Não nascemos a saber fazer a nossa higiene física, fomos aprendendo até que tudo se tornou num hábito. A higiene emocional funciona da mesma maneira, pequenos hábitos diários ajudam-nos a manter limpinha a nossa “casa emocional”. Trata-se de um processo que trás os seus desafios e requer foco, tempo e paciência da nossa parte. Requer que vivamos presentes na nossa própria realidade, saindo do loop da ilusão/fantasia, assumindo as rédeas/responsabilidade da nossa vida. Viver na fantasia não nos ajuda e por vezes, mesmo que seja inconsciente, o que estamos a fazer é não querer lidar com a nossa própria realidade.
Todos nós somos diferentes, temos histórias de vida diferentes, diferentes personalidades, “feitios”, perspectivas, sonhos, etc. Por isso só faz sentido que cada um de nós seja o criador da sua própria higiene emocional, mas claro há pontos fulcrais como a maneira como falamos connosco em situações de fracasso, julgamento ou erro…É impreterível que a nossa conversa para nós seja feita com compaixão, amor, aconchego, calma e ligeireza.
Voltando ao exemplo da perna partida, não vamos propositadamente infligir dor física na nossa perna partida, então com as emoções é a mesma coisa. Aconteceu-te algo que te deixou abalado? Não te castigues, não fiques a ruminar sobre isso dias e dias a fio, sê gentil contigo. A vida não é suposto ser um mar de rosas. Precisamos de passar por certas experiências, acontecimentos e processos para crescer, mudar. Mas como aprendemos a lidar com tudo isto pode ser o ponto de viragem. Ao teu próprio ritmo, com calma, subindo um degrau de cada vez, começando pelo mais simples. Nenhuma casa se constrói começando pelo telhado. Aceitando como és (bom e mau), acolhendo e validando os teus sentires e as tuas emoções, sem autocrítica.
Ninguém é perfeito. Não tentes fazer o ideal, mas sim o que te for possível a cada momento. Define objetivos realistas para ti, pequenos hábitos que gostarias de implementar e que te permitem pôr o “comboio em marcha”. Sabendo que vão sempre haver aqueles dias em que não vai apetecer fazer nada e que talvez precises de te forçar um pouco a continuar. Desistir de nós é viver na dormência, é usar a mesma roupa que muitos outros usam só para andarmos lindos pela rua, mas no fundo essa roupa não nos serve interiormente.
Se no início do artigo partimos da premissa que o corpo e a mente andam juntos e se influenciam mutuamente, então podemos calcular que uma pobre higiene emocional, ou o dito empurrar o pó para debaixo do tapete, pode de facto ser responsável por vários distúrbios e doenças, desde a insónia, à úlcera, ansiedade, depressão, cancro, diabetes, etc. O corpo vai sinalizando o que vamos tentando calar na mente, e por vezes o corpo grita se assim tiver de ser. Mas o contrário também pode acontecer, à medida que vais melhorando a tua higiene emocional, a tua mente rejuvenesce e isso será manifestado no teu corpo, na melhoria da tua saúde física, na leveza das tuas expressões e na energia da tua presença.
Em suma, não tens de ser perfeito, apenas fazer o que te é possível a cada momento ou altura da vida. Envolve-te no teu processo de crescimento pessoal, vive presente e não fujas da tua própria realidade. Descobre o que resulta para ti e procura ajuda profissional se precisares. O teu potencial é infinito.
Daniela Nolasco, Professora de Yoga e Yoga suspenso no FIT IT